Vou lhes contar uma história...
Triste, ou alegre, quem vai saber...
Uma certa gata, se escondia nos galhos de uma nogueira, sua árvore desde sempre. Ela tinha medo de sair, pois seus passeios nunca acabavam bem. Se limitou aos arredores de sua árvore, onde se sentia segura, pois fora educada a viver dentro do circulo, por conta seus instintos. Uma fera educada para ser, nem mesmo a sombra do que nascera pra ser.
Viu todas suas amigas evoluírem, tornarem-se lindas e exuberantes criaturas nas mais variadas espécies, umas com asas e outras com outras vantagens, e ela porém presa ao chão, ao seu galho, furtiva nas folhagens...
Um dia, cansada de apenas circular, quis dar uma volta, e foi até as margens do Rio, beber e comer, foi quando viu algo tão inesperado, pois que a figura si afugentava qualquer um que a visse, então não entendeu porque ele não fugiu, e já desconcertada parou seus passos diante dos olhos paralisantes dele que disse:
-Oi, tudo bem?
Sua resposta foi toda atrapalhada, mas manteve sua pose, afinal todos fogem:
-Sim, obrigada.
Ele sorriu, e continuou o seu caminho, ela o dela, mas não antes de se olharem atentamente.
A expressão curiosa e misteriosa daqueles olhos não saíram mais da mente. Virava e mexia, eles a encaravam, como se olhassem além, como se vissem além dos olhos lindos profundos e tristes dela que se sentiu despida, invadida, profanada, mas muito atraída.
Ela comeu e bebeu, mas o tempo todo uma sensação de estar sendo observada. Quando terminou voltou para o seu galho.
Lá de cima, em meio as folhas, percebeu que ainda não tinha reparado a vista maravilhosa que tinha. Todas aquelas copas de árvores, umas altas, outras baixas, a passarada fazendo festa, seus olhos se abriram de uma maneira tão ampla que nada cabia no seu campo de visão. Então olhou lá, próximo a margem, sob a sombra do carvalho, estava ele que também olhava para ela, coisa que ele fazia já havia algum tempo.
Os dias se seguiram, e ela mal podia esperar que eles se esbarrassem outra vez. Ela voltou no Rio algumas vezes, e não o viu.
Foi então, que passava por ali um rebanho, não muito numeroso, mas que iria aumentar no encontro do Rio com as águas da Cachoeira, lá estava ele, passando bem no meio do gado, faceiro e presunçoso, olhou para ela que também passava, sorriu como quem a desafiasse continuar olhando, e ela não recuou, cedeu aos seus instintos, aceitando o desafio.
Aquela troca de sorrisos e olhares, durou o suficiente, até o encontro das águas, depois dali cada um tomou seu rumo.
Dias depois ele estava à beira do Rio, debaixo do seu carvalho, quando ela chegou silenciosa, mas ele já sabia da presença dela, e tentou deixá-la mais à vontade:
-Segundo nossas naturezas, um de nós não sairá vivo desse encontro...
-Faz tempo que não me alimento. -retrucou ela com destemor.
-Eu também, entretando tenho sangue frio, posso ficar meses sem me alimentar...
-Isso não faz de você mais forte.
-Nem fraco. Te observo já faz tempo...Nunca vi uma fera tão pacata, você se segura muito, por quê? Você é linda, e se esconde? -dia isso enquanto a rodeava- Tem um poder que poucos tem e muitos desejam. Sua natureza é livre, e não aproveita, fica deitada lá em cima, o mundo não é só o seu quintal.
Ela se assustou com o que ele dizia:
-Não sou nenhuma fera! -bradou.
-Não negue quem você é!
E caminhando até a beira d'água, ele mostrou para ela um reflexo :
-O que vê?
-Uma onça.
-Eu vejo uma fera, presa por correntes e jaula invisíveis. Uma fera linda, cheia de um potencial desconhecido por ela mesma. -ela olhou demoradamente para o que via, de uma forma jamais vista por ela própria, encontrou a criatura a quem ele se referia, ele virou o rosto dela para ele e olhou profundamente nos olhos dela, alisou seu rosto delicadamente e continuou -tens uma beleza rara, uma pureza que nunca vi, do que você tem medo?
-Há muito não via esta fera, e é melhor que continue assim. Dessa forma não haverá estragos desnecessários, vidas serão poupadas, e todos ficarão bem.
-Menos você! -disse ele com pertinência.
-É um preço.
-Que você não precisa pagar sozinha. Vamos! Liberte-se!
Olhando triste para a imagem na água, ela disse:
-Não posso, é arriscado demais, muito perigoso..
Se virou rapidamente, e num salto sumiu.
( continua )
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